domingo, 12 de março de 2023

STACCATTI 1 - O INÍCIO (OLD CITY 3) Uma história do CliffHangerVerso

 

NA VERDADE, DESDE A INFÂNCIA ERA MUITO FÁCIL PERCEBER QUE ENZO STACCATTI1 SERIA COMO SE TORNOU AO CHEGAR À IDADE ADULTA.

AOS 10 ANOS DE IDADE, ELE MANTINHA PREGADO NA PARTE INTERNA DA PORTA DE SEU GUARDA-ROUPA UM PÔSTER DO FILME EVIL DEAD 2, AQUELE DA CAVEIRA COM OLHOS, PARA ASSUSTAR QUEM ABRISSE O MÓVEL.

MUITOS ANOS SE PASSARAM. AS BRINCADEIRAS FICARAM MAIS INTENSAS. MAIS ELABORADAS. E TUDO DESANDOU DEPOIS QUE ELE SOFREU UMA QUEDA DURANTE CERTA EXPEDIÇÃO A UMA REGIÃO CHEIA DE CACHOEIRAS. ESCORREGOU NAS PEDRAS MOLHADAS, BATEU A CABEÇA, FOI LEVADO INCONSCIENTE PARA O HOSPITAL, ONDE PERMANECEU EM COMA POR TRÊS DIAS. AMIGOS E PARENTES JÁ IMAGINAVAM QUE ELE NÃO VOLTARIA, QUANDO, AFINAL, VOLTOU.

A PRIMEIRA FRASE QUE ELE DISSE AO ACORDAR FOI PARA SUA IRMÃ, QUE ESTAVA A SEU LADO NO LEITO DE HOSPITAL (A MÃE, EXAUSTA, TINHA IDO PARA CASA DESCANSAR, E AS DUAS SE REVEZAVAM).

“E EIS QUE, NO TERCEIRO DIA, ELE RESSUSCITOU!”

. . . 

ATÉ HOJE HÁ QUEM DUVIDE QUE FOI ELE QUEM VOLTOU DE ALÉM DO VÉU DO COMA.

QUER DIZER, BASICAMENTE ELE CONTINUA O MESMO, MAS ALGUMAS COISAS MUDARAM. UMA DAS COISAS FACILMENTE PERCEBIDAS POR QUEM O CONHECIA ANTES É O OLHAR. ANTES PROFUNDO E SONHADOR, PASSOU A SER FRIO, GELADO E INESCRUTÁVEL. COMO UM OLHO DE VIDRO.

OUTRA COISA É O SEU HUMOR, QUE ANTES ERA LEVE, APESAR DAS BRINCADEIRAS QUE ALGUNS CHAMAVAM DE SEM GRAÇA E ELE DIZIA QUE ERAM JUMP SCARES: TORNOU-SE MAIS PESADO. MUITO MAIS. 

IRÔNICO, SARCÁSTICO E EM ALGUNS CASOS ATÉ CRUEL. NÃO SE INCOMODA EM SER CRUEL NO USO DE VERDADES – SEMPRE VERDADES – QUE ALGUNS ATÉ CONHECEM, MAS QUE TODOS PREFEREM IGNORAR PARA NÃO CONSTRANGER DETERMINADAS PESSOAS.

MAS A MAIOR MUDANÇA VEIO À TONA CERCA DE SETE MESES DEPOIS DE SUA “RESSURREIÇÃO”. DURANTE FESTA DE ANIVERSÁRIO DE UM AMIGO DA FAMÍLIA, UMA DAS PESSOAS AFRONTADAS PELA RECENTE E EXTREMA 'FRANQUEZA' DE ENZO NÃO GOSTOU E PARTIU PARA A AGRESSÃO FÍSICA. OU MELHOR, PARA UMA TENTATIVA DE AGRESSÃO. 

STACCATTI SEMPRE TINHA SIDO UM SUJEITO AVESSO A BRIGAS E EMBATES CORPORAIS, MESMO DE BRINCADEIRA. AMANTE DE LIVROS E INDIFERENTE A EXERCÍCIOS FÍSICOS, CERTAMENTE PERDERIA NUM CONFRONTO CORPO A CORPO CONTRA PRATICAMENTE QUALQUER PESSOA. O SUJEITO QUE APELOU ERA BEM MAIOR QUE ELE, NOTÓRIO BRIGÃO DE RUA E FREQUENTADOR DE ACADEMIAS DE MUSCULAÇÃO. PARA OS QUE VIRAM A SITUAÇÃO COMEÇANDO A AZEDAR, O RESULTADO DA REFREGA SERIA ÓBVIO. JÁ SE PREPARAVAM PARA IMPEDIR QUE ENZO FOSSE MUITO MACHUCADO, O QUE DEVERIA ACONTECER LOGO NO PRIMEIRO SOCO.

MAS JUSTAMENTE ESSE GOLPE, DADO COM RAIVA, MAS COM PRECISÃO, ACHOU APENAS O AR, GRAÇAS A UMA ESQUIVA IMPRESSIONANTE DO ‘FRANCO’. O AGRESSOR NEM TEVE TEMPO DE SE ASSUSTAR COM A FALHA DE SUA AÇÃO: VINDO DE BAIXO PARA CIMA, UM UPPERCUT BRUTAL TEVE COMO ENDEREÇO CERTO SEU QUEIXO, ATINGIDO COM TAMANHA VIOLÊNCIA QUE MAIS DE UM DENTE SE PARTIU. 

DIANTE DA PLATEIA ESTUPEFATA, AS PANCADAS SE SUCEDERAM NUM RITMO VERTIGINOSO. LOGO, EM MEIO A GOLFADAS DE SANGUE SAÍDAS DA BOCA E DO NARIZ DE MANFREDO, ESTE DESABOU PESADAMENTE NO CHÃO.

JÁ SERIA DE ESPANTAR QUE UM INEPTO PARA AS ARTES MARCIAIS SE SAÍSSE TÃO BEM AO SE DEFENDER E CONTRA-ATACAR. MAS O QUE SE SEGUIU DEIXOU MUITOS NA DÚVIDA SE AQUELE ERA REALMENTE O ENZO CONHECIDO E AMADO POR TODOS QUE VOLTARA DE UM PERÍODO DE 72 HORAS DE TOTAL INCONSCIÊNCIA.

MESMO COM O OPONENTE NOCAUTEADO NO CHÃO E JÁ DESACORDADO, ENZO CONTINUOU A BATER. E TERIA TALVEZ CONTINUADO ATÉ MATAR MANFREDO SE NÃO TIVESSE SIDO, A MUITO CUSTO, TIRADO DE CIMA DO FRACASSADO ATACANTE. QUESTIONADO POR SUA IRMÃ QUANTO AO COMPORTAMENTO REPROVÁVEL, RESPONDEU DE MODO BIZARRO:

“QUEM SAI PRA GUERRA PRECISA CONSIDERAR A POSSIBILIDADE DE NÃO VOLTAR.”

ALGUNS DOS PRESENTES SENTIRAM QUE AQUELA SITUAÇÃO ASSUSTADORA E MISTERIOSA ESTAVA APENAS COMEÇANDO.

E ESTAVAM INTEIRAMENTE CERTOS.

  

 

 

1O nome do protagonista vem da expressão musical staccato (ou destacado), também chamado de ponto de diminuição, que designa um tipo de fraseio ou de articulação no qual as notas e os motivos das frases musicais devem ser executadas com suspensões entre elas, ficando as notas com curta duração. É uma técnica de execução instrumental ou vocal que se opõe ao legato.

sexta-feira, 10 de março de 2023

O AVISO (OLD CITY 2) Uma história do CliffHangerVerso

 

O detetive Mixéu (sim, escrito desse jeito, o pai era analfabeto e não levou o nome escrito para o escrivão, que era muito mal informado) é viciado em previsão do futuro. Fanático por horóscopo, visita constantemente cartomantes, videntes e ciganas, crendo piamente nas previsões das tais. Faz como fazem os preocupados com a própria saúde, com seus checkups periódicos apenas para se certificarem de que não arranjaram alguma moléstia desde a última checagem; no caso de Mixéu não é a saúde e sim o amanhã a preocupação.

Sai da tenda da cigana bastante preocupado. Segundo ela, sua vida está correndo sério perigo, alguém com 18 dedos vai acabar com ele. Passa dois dias preocupado. Intrigado. Quem será? Então, resolve repassar as anotações que mantém de cada uma das condenações de criminosos que ele prendeu. Alguns morreram na cadeia, outros ainda deverão cumprir alguns anos... e um deles será solto em poucos dias depois de cumprir pena na Penitenciária de Lostipleice! Justamente o Chico18, que tem esse apelido por lhe faltarem dois dedos na mão direita, o anelar e o mindinho.

Ainda bem que a cigana avisou. O sujeito não aprendeu que o crime não compensa. Planeja matar o homem que o prendeu. E não se pode usar o testemunho de uma cigana no tribunal. Não há o que fazer.

Pelo menos, não... juridicamente.

O começo da elaboração do plano é entremeado de um doloroso conflito ético. Mixéu é um homem da lei, está do lado certo e se orgulha disso, defendendo cidadãos de bem, ou que pelo menos não sejam bandidos, de gente ruim. E castiga os rebotalhos da sociedade, às vezes com a prisão, às vezes com o cancelamento de seus CPFs. Mas as criaturas que matou, foi sempre ou em troca de tiros ou em situação de legítima defesa. Nunca executou ninguém a sangue frio, e achava que jamais faria isso. É errado, é cruzar a linha e passar para o lado errado da lei.

Mas quando o ser humano quer ou precisa fazer algo, começa a elaborar argumentos que tornem menos condenável o ato a ser praticado. Sistemas de atenuação de culpa. Na verdade, se Chico18 tem a intenção de matá-lo, se ele o matar antes não será nada mais do que legítima defesa.

Um dia depois de liberto, o sujeito é encontrado morto dentro da casa alugada numa rua da periferia. A investigação é breve, e Mixéu imaginou que seria mesmo, por dois motivos. Primeiro, não havia testemunhas e, depois, não era o tipo de pessoa com quem alguém se importasse. Como o finado teve vida criminosa pregressa, todos são rápidos em ‘concluir’ tratar-se de um acerto de contas.

Aliviado, o detetive segue a vida. Sente-se renascido. Na visita seguinte à cigana que o alertou, dá a ela uma gorjeta considerável que a deixa muito feliz, porém confusa.

– Mas por que está me dando esse dinheiro?

– Você é uma cigana. Pergunte para a bola de cristal.

Caminha tranquilamente de volta pra casa. Um grito chama sua atenção. Uma mulher aparentemente ameaçada clama por socorro. O pedido desesperado vem do fundo de um beco escuro. Mixéu saca sua arma, cauteloso porque pode ser uma armadilha, e entra na travessa mal iluminada.

Com as costas na parede que encerra o beco, uma mulher com olhos esbugalhados e com a camisa aberta mostrando um belo seio balbucia frases desconexas, mas o detetive entende o que precisa entender: um homem a atacou e, vendo chegar uma possível ajuda para a vítima, fugiu por um caminho lateral. Mixéu dá três passos e sente a dor pungente de um tiro no antebraço direito. O revólver cai no chão com a repentina inutilidade da mão que o segurava.

Será que o homem da lei tinha passado pelo marginal e não o vira?? Voltando-se para ver quem atirou, dá de cara com olhos apertados de ódio, a mulher segura a arma com firmeza, apontando-a para a cabeça dele.

– Aulas de tiro são muito úteis para uma mulher que quer se defender. Mas nunca pensei que mataria um policial.

O homem olha para a arma no chão. Será que consegue pegá-la com a mão esquerda e atirar?

– Nem pense nisso. Estará morto antes de encostar no revólver.

Atônito, Mixéu tenta ganhar tempo...

– Por que diabos atirou em mim...?

– Meu irmão planejava levar uma vida honesta depois de pagar pelo seu crime. Por que você o matou?

Compreendendo quem era a pessoa, restava ao ferido saber como ela podia acusá-lo com tanta certeza. Tentou como desesperada estratégia negar o assassinato.

– Está louca? Quem te disse que eu o matei? Quem falou isso, mentiu!

– Ninguém disse. Eu vi. Estava visitando o Chico, tinha ido ao banheiro quando você invadiu a casa dele e o matou sem nenhum motivo. Vi você pela porta entreaberta, mas a arma estava na bolsa sobre a mesa da cozinha e tive medo. Fui covarde. Mas agora vingo meu irmão.

Mixéu abriu a boca para dizer ainda nem sabia o quê, mas um estampido impediu a futura frase e qualquer outra que pudesse sair da boca dele. Bem no meio da testa. A bala cravada na parede atrás, com sangue e partículas de osso e massa encefálica. Para garantir, mais um disparo, totalmente desnecessário, já que a vida não mais habita o corpo que pertenceu a Mixéu Fernandes.

Suspirando com uma sensação de dever cumprido, Francielle guarda, agora com mãos trêmulas, o pesado .38 na bolsa. Não sem certa dificuldade, embora mínima, já que lhe faltam dois dedos na mão direita, por causa de uma deformidade, fruto de desarranjo genético, que afeta não apenas ela, mas seus dois irmãos, ambos atualmente mortos.

SLMB, 10/03/2023, 12h54, sexta-feira.


sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

WHITE CASTLE

 O velho escritor olhou para o passado e viu que não podia reclamar da primeira metade de sua vida.

Não tivera privações materiais em criança, e contara (coisa rara na sociedade daquela época) com a afetividade dos pais, que, embora firmes em sua educação, jamais usaram de violência verbal ou física para com o filho único. Estudara em boas escolas, tivera bons amigos, cedo conhecera as delícias da carne, muitas delas proibidas, tivera muitas mulheres e, ao se lançar escritor, obtivera excepcional aceitação. Antes de entrar na casa dos trinta anos, já vivia exclusivamente de sua produção literária, outra coisa muito rara naqueles tempos.

Conhecera o amor de sua vida e soubera que ela o seria no exato momento em que nela pousara a vista. Mas a paz conjugal tinha sido ameaçada pela queda na renda vinda dos livros, havia cada vez mais concorrência e cada vez menos leitores. Buscando na jogatina uma maneira de melhorar a vida financeira, descobrira tarde demais que era um péssimo jogador. Da casa enorme com cômodos jamais utilizados, mudara o casal e os dois filhos para uma residência modesta num bairro pobre e afastado.

Os dois filhos depois de bem pouco tempo deram nada mais que desgosto. Um deles, cedo diagnosticado louco, era extremamente agressivo – chegara a bater nos próprios pais algumas vezes! –, acabando por se meter numa briga de rua que lhe custara a vida. O outro, que também era doente, mas de caráter, ficou conhecido como um vigarista de marca, e acabou eliminado por causa de um golpe vultoso que aplicara a um homem rico de dinheiro e pobre de tolerância. A esposa jamais voltara a ser a mesma depois de perder ambos os filhos. O escritor na verdade sentira alívio, mas, obviamente, jamais deixou sua amada perceber isso.

Quando parecia que as coisas melhorariam com um surto de interesse por seus livros, que viraram tema de vestibulares, começaram os problemas na vista. A cegueira total se anunciava, com o mundo do autor mergulhando em trevas cada vez mais densas. Tornou-se dificílimo escrever. Ditar era algo que o escritor abominava, considerando a situação absurdamente humilhante.  Ao longo dos anos, gastou o que tinha e o que não tinha com os melhores especialistas em busca de uma cura, mas em vão.

Chamou para jantar em sua casa o mais recente na lista dos oftalmologistas, e, durante a refeição, pediu que o médico fosse inteiramente sincero. Não havia cura, não era assim? Bem que o profissional tentara não dizer a verdade de modo por demais cru, mas o discurso otimista sem nenhum embasamento científico foi a confirmação de que em breve o escritor mergulharia em trevas absolutas.

Chegada a hora de a visita ir embora, o escritor ficou sentado em seu lugar à cabeceira da mesa. A esposa acompanhou o médico até a porta. Antes que o Doutor cruzasse o pórtico, ambos ouviram o estampido.

Correram para a sala de jantar. Da têmpora direita do cadáver desabado de bruços sobre a mesa, vazavam sangue e massa encefálica. Posteriormente a viúva considerou que, dado o fato de que o marido trazia o revólver no bolso durante o jantar, o suicídio já estava decidido de antemão, e que o convite para jantar tivera o objetivo de impedir que ela passasse pelo trauma ainda maior de, sozinha, encontrar o corpo morto do companheiro de tantos anos.

Durante os três anos em que guardou luto fechado e se manteve em completo isolamento social, a viúva definhou a olhos vistos. Ao cabo desse tempo, partiu ao encontro do seu amado, morrendo serenamente durante o sono.

SLMB, 09/02/2023

Nota:

Feitas algumas adaptações, “White Castle” é inspirado na vida do escritor lisboeta Camilo Castello-Branco, daí o título da narrativa. Com exceção do fim autoinfligido, em condições bastante correspondentes à realidade, a existência de Camilo teve muito mais sofrimentos (e uma não mencionada e considerável dose de desatinos e más escolhas).

O HOMEM QUE O CAPITÃO AMÉRICA MATOU (NA VIDA REAL!)

 



Nascido Ricardo Gerold Purcell Jr. no dia 6 de agosto de 1905 (e não em 1908, como muitas fontes sugerem) em Greenwich, Connecticut, EUA, o ator de nome artístico Dick Purcell começou no teatro, e durante a temporada da peça Paths of Glory (Caminhos da Glória), um caçador de talentos avistou Purcell e isso o levou a um pequeno papel no filme Ceiling Zero (1936). Seu próximo filme foi Man Hunt (1936), no qual Purcell teve um papel maior como repórter de jornal. Extremamente prolífico e esforçado (o que se revelaria uma péssima ideia futuramente), Purcell apareceu em ONZE filmes apenas em 1936.

No ano de 1944 a Republic Pictures, que três anos antes já havia se aventurado na seara super-heroística com "The Adventures of Captain Marvel", produziu "Captain America", uma série com 15 episódios de 20 minutos cada, repletos de grande dinamismo, porém sem nenhum compromisso com as histórias em quadrinhos. O Sentinela da Liberdade não tinha superdorça oriunda do Soro do Supersoldado (que nem sequer existe nessa versão) e não usa como arma de ataque e de defesa o famoso escudo. Não há as asinhas na máscara, as botas estilo bucaneiro foram substituídas por sapatos de cano alto que um funcionário estatal poderia usar sem problema, e as listras verticais apareciam apenas na parte da frente do uniforme. Nem mesmo era Steve Rogers o alter ego do herói, mas o Promotor Público Grant Gardner, que não enfrentava supervilões ou espiões nazistas (orçamento para efeitos especiais não existiam, e na verdade nem os próprios efeitos especiais!), mas um bandido autointitulado Escaravelho, (identidade secreta do curador do museu Dr. Cyrus Maldor). O criminoso objetivava o uso de um par de dispositivos de super arma, o "Dynamic Vibrator" e o "Electronic Firebolt". Além de Maldor, pululavam na telona criminosos comuns e, ocasionalmente, algum cientista louco.

Purcell teve a sorte de ganhar o papel-título e encarnar o bandeiroso. Embora fosse um bom ator para os padrões da época, foi “sorte” porque ele estava bastante fora de forma para interpretar um paladino da justiça. Mas o público daqueles ontens não era tão exigente, e a série tornou-se um sucesso de bilheteria. Foi a mais cara produzida pela Republic, sendo também a última sobre um super-herói produzida pela empresa.



Como ser humano, consta que Purcell era um cara gente boa, mas era um tanto impulsivo e agia sem pensar muito nos prós e nos contras de suas ações, isso inclusive em termos de aceitar papéis no teatro ou no cinema. Mas, como visto já foi, ele era um cara de sorte, e sua carreira seguiu sem tropeços consideráveis. Na vida pessoal também era arrebatado, como atesta uma passagem de sua existência: fugiu para Las Vegas com a atriz Ethelind Terry, casou com ela em 3 de março de 1942 e dela se divorciou em 26 de agosto do mesmo ano.

A razão de ser do título deste texto é o fato de que, provavelmente querendo compensar o físico desvantajoso para aquela empreitada, e para calar alguns colegas de profissão e empresários do entretenimento que faziam troça com isso, o ator fez questão de se desincumbir pessoalmente de todas as façanhas físicas do personagem. Em tempos de pouco cuidado com a saúde e sem nenhum esquema preventivo como os que existem atualmente, Purcell não sabia que seu coração não batia muito bem, literalmente. Veio a saber da pior maneira.  

Pouco depois de concluir a série de filmes do Capitão América e pouco antes de seu lançamento geral, Purcell desmaiou no vestiário de um clube de campo de Hollywood em Los Angeles em 10 de abril de 1944, logo após jogar uma partida de golfe. Tombou fulminado por um enfarte de miocárdio, contando apenas 38 anos de idade. Seus restos mortais foram enterrados no Cemitério Holy Cross, Culver City.

Quem primeiro levantou a ligação entre a morte do ator e seu desempenho como o Capitão América foi o historiador de cinema Raymond Stedman. Foi realmente o caso de um artista que deu a vida pela arte (mesmo não sabendo que o fazia).



(NOTA: a ideia para a pesquisa dessa história veio de uma postagem de Belchior Cardoso em seu Grupo de Facebook HEROILOGIA, na data de 10/02/2023. A ele o mérito e os agradecimentos devidos.)